Senadores,
Venho acompanhando com grande interesse a tramitação do projeto de lei (PLC 122/06) que criminaliza a homofobia. No meu entender, esse é o projeto mais importante atualmente no Brasil para garantir os direitos de gays e lésbicas e só tem comparação na história brasileira com a lei que tornou crime a discriminação racial. Tenho grande esperança que a matéria seja aprovada com rapidez.
Mas o motivo desse email é minha incompreensão em relação a escolha dos convidados para as audiências públicas que discutem o assunto. Como é possível debater um projeto de interesse dos homossexuais e não haver entre os convidados sequer um militante dos direitos de gays e lésbicas? Imaginem como seria estranha uma audiência pública sobre direitos indígenas ou direitos de afro-descendentes em que apenas brancos fossem ouvidos para falar "deles", "dos outros".
Mais estranho ainda é que, apesar da ausência de militantes homossexuais, sejam ouvidas várias vertentes religiosas representadas por pessoas que são ditas celibatárias ou ditas heterossexuais. Convidar essas pessoas para discutir homossexualidade é como chamar a Ku Klux Klan para debater o racismo. Ainda assim são chamadas pelo Senado para opinar sobre um assunto que não tem qualquer relação direta com a vida delas.
Não influi na vida deles, mas trata-se de um assunto que é questão de sobrevivência e que pode modificar profundamente o dia-a-dia de milhões de brasileiros que são discriminados das mais variadas formas, da hora que acordam até a hora que vão dormir.
Vale lembrar que, apesar de não ter praticamente nenhuma cobertura da grande mídia, nem apoio financeiro ou organização formal no transporte dos manifestantes (diferente do que acontece em manifestações religiosas), a Parada do Orgulho Gay de São Paulo reuniu no ano passado 3 milhões de pessoas e no ano anterior contou com 2 milhões de participantes. É, sem dúvida, a maior e mais espontânea manifestação popular contemporânea do Brasil.
Se os senhores me perdoarem a ousadia, sugiro o nome do presidente do grupo Estruturação, Welton Trindande, aqui mesmo de Brasília, para ser ouvido em outras eventuais audiências públicas sobre o projeto 122/06. O contato do Estruturação pode ser feito pelo telefone 3036-4544 e o email do grupo é estruturacao@estruturacao.org.br.
Se eu puder ser mais ousada ainda, peço que façam um exercício simples para se colocarem "no lugar do outro". Basta que troquem a palavra "homossexuais" por "negros" nas frases dos que são contrários aos projeto e defendem a manutenção do "direito" de discriminar gays e lésbicas. Hoje a consciência do horror que é o racismo já faz parte do senso comum da sociedade brasileira e esse simples exercício ajuda a ver o quanto de discriminação existe no discurso dos que não desejam a aprovação do projeto.
Vejam essa frase, por exemplo, retirada de reportagem publicada na Agência Senado ( http://www.senado.gov.br/agencia/verNoticia.aspx?codNoticia=63540&codAplicativo=2¶metros=cdh):
"Crítica idêntica foi feita pelo advogado Paulo Melo da Costa, que, ao contrário de Lívia, entretanto, considerou o projeto inconstitucional por conferir mais direitos aos homossexuais (imagine se aqui ele tivesse dito NEGRO) que ao restante da população."
ou ainda
"Além de inconstitucional, o projeto (que proibiria a discriminação contra NEGROS) atentaria contra a liberdade de opinião, segundo o assessor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) Paulo Leão."
Agradeço a atenção de vossas excelências e peço que aprovem com rapidez o projeto 122/06, matéria que trará melhor qualidade para a vida de milhões de brasileiros. Tenho confiança que vossas excelências aprovarão essa lei especialmente porque o único argumento contrário a proposta é a manutenção do "direito" de discriminar homossexuais. E se fosse negros? Os senhores deixariam isso acontecer?
Atenciosamente
sexta-feira, 25 de maio de 2007
Carta aos senadores:
Carta enviada aos senadores que estão realizando audiências públicas sobre o projeto de Lei da Câmara (122/06) que criminaliza a homofobia. A proposta é de autoria da deputada Iara Bernardi e já foi aprovada na Câmara dos Deputados.
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